Uma das perguntas que a gente mais recebe aqui dentro do CR_IA é se você pode usar de forma comercial o que você criou usando a inteligência artificial. A resposta, para a maior parte dos casos, vai ser sim, mas tem vários poréns e várias práticas que a gente gostaria de mostrar para vocês sobre direitos autorais usando a inteligência artificial para isso.
Então, vamos discutir um pouquinho. Para começar, eu acho que existe uma discussão muito ampla, para a qual eu não tenho resposta e nem quero ter uma resposta agora. Eu tenho a minha visão, mas não é isso que importa aqui nesse momento.
Mas, valendo um milhão de reais: quem tem os direitos de uma obra criada por inteligência artificial? Sou eu que fiz o prompt? É quem teve o material treinado? É o dono da plataforma? É a plataforma em si? Quem que vira o dono dessa obra? Quem que a gente pode chamar desse jeito? Não existe uma resposta muito simples para isso, mas aí eu queria trazer várias discussões aqui sobre as boas práticas que a gente acha que é interessante você ter, que a gente recomenda aqui dentro do CR_IA, quando a gente fala de direitos autorais e criação por inteligência artificial.
Por isso, vamos lá para um guia de boas práticas para esse uso da IA para você não ter tantos problemas com direitos autorais, ou não ter nenhum problema com direitos autorais. Vamos tentar pensar mais alto aqui, né?
Para começar, dentro dessas boas práticas, eu recomendo muito que você leia, atentamente — ou não — os termos de uso das ferramentas. Eu acho que sempre, se a gente tem alguma dúvida se pode usar de forma comercial ou não uma ferramenta, é importante a gente ler esses termos de uso, o que está dentro dos termos de uso. Então, por exemplo, no ChatGPT você tem direito a usar o que for gerado por ele. Mas no Midjourney, por exemplo, você tem direito apenas se pagar pela plataforma. Se você fez alguma coisa pagando, você tem direito. Várias delas funcionam desse jeito.
Por exemplo, o Suno, que é o criador de música, também funciona assim: você tem direito se pagar pela plataforma. Se não paga, não tem direito, mas fica um pouco dentro disso. Ah, mas eu não quero ler termos de uso, que coisa chata também. Eu também odeio termos de uso, nunca li termos de uso até a inteligência artificial aparecer, porque agora o que eu faço é simplesmente um prompt assim:
“Eu tenho os seguintes termos de uso para uma plataforma, resuma os termos de uso em pontos bem simples e claros, dando destaque para o que parece mais incomum. Além disso, me indique claramente como funcionam os direitos autorais da plataforma. Eu posso fazer uso comercial do que eu criar?”
Você copiando e colando os termos de uso na ferramenta, usando um prompt desses, já consegue a resposta. Agora fica muito mais fácil para você entender e saber seus direitos no termo de uso. Todo termo de uso agora eu leio porque passo pelo ChatGPT num prompt mais ou menos assim, e tenho uma noção do que estou me metendo — é uma coisa importante, até em termos de acessibilidade.
O que eles vão dizer? Quase todas as plataformas sempre vão te dizer que o output, o seu resultado de uma inteligência artificial, pode ser usado comercialmente. Mas será que é mesmo verdade? Para isso, eu queria trazer uma discussão aqui.
Você provavelmente conhece esse quadro que é a Noite Estrelada do Van Gogh. Eu posso ir lá dentro do Midjourney, por exemplo, e colocar um prompt tipo: “Uma pintura do Rio de Janeiro no estilo do Van Gogh.” Vou ter ali uma pintura do Rio de Janeiro, digamos, duvidosa, de um gosto duvidoso, inspirada no Van Gogh, que tem uma área meio cinza ali, porque o Van Gogh não tem mais direitos autorais sobre a obra dele — coitado, nunca teve, se pensar bem.
Mas, se eu vou lá e peço, por exemplo, “uma noite estrelada no estilo Van Gogh”, posso ter essa resposta aqui: uma imagem gerada pelo Midjourney, que tecnicamente eu tenho direitos autorais. Só que é uma imagem que basicamente está copiando, igualzinha, quase igual a imagem do Van Gogh em si. Eu teria direito nessa imagem? Se o Van Gogh estivesse vivo e fosse um artista famoso agora, eu teria esse direito? Provavelmente não. Eu não poderia usar essa imagem de forma comercial, por mais que a IA tenha gerado e por mais que o Midjourney me diga que eu posso, porque foi gerado por eles e eles dão direito a isso.
Eu usei exatamente o prompt “Starry Night in the Style of Van Gogh”. Eu nem sabia que o Van Gogh tinha essa pintura, eu conhecia o Van Gogh mas não sabia dessa obra. Aí eu faço essa imagem e uso. Tudo bem, estamos falando do Van Gogh, mas... Essa imagem criada pelo Microsoft AI em 2023, você tem direito ao Mickey aqui? É uma imagem muito engraçada, jogando o avião nas Torres Gêmeas — já está com as duas torres afetadas, aí tem o terceiro avião, o quarto avião, então, o Mickey está chegando tarde para a festa.
Enfim, essa discussão é toda sobre direitos autorais de se você tem ou não direito autoral sobre a imagem do Mickey. A resposta é não. Por mais que você vá lá no Midjourney e gere essa imagem, por mais que você faça isso, a resposta é não, você não pode usar.
Aqui já vamos para o segundo ponto das nossas dicas de boas práticas: cuidado ao referenciar autores, artistas e obras específicas. Por exemplo, o próprio Mickey dentro do prompt. Isso não significa que você poderia usar. Quando falamos de tomar cuidado, vale muito isso. Por exemplo, “Escreva um poema como se fosse Fernando Pessoa” ou algum outro autor vivo com copyright protegido, ou algo do tipo. Quando a gente fala desse uso, é sempre importante. Várias empresas têm essa política.
Eu fiz um trabalho há um ou dois anos para a WGSN, uma empresa de tendências, e eles já tinham uma política de IA, por isso é importante ter políticas de IA dentro das empresas. A política deles dizia: sim, você pode usar imagens de IA desde que não faça referência a nenhum artista dentro do prompt. Você até pode usar para referência, se estiver em uma fase de ideação, tentando chegar em alguma coisa, mas como produto final a gente tem que tomar muito cuidado. Eu acho que não deveria fazer isso, na verdade.
E até a plataforma deveria proibir, né? Se você for no Firefly, por exemplo — criador de imagens da Adobe — e pedir “uma noite estrelada no estilo Van Gogh”, ele vai te dar uma notificação falando que você não pode fazer isso porque não se pode citar artistas ou outras pessoas.
O mesmo vale para o Suno: se você pedir uma música no estilo Anitta, ele vai falar que não pode fazer nada direcionado a um artista específico. Mesmo assim, você vai ver muitas cores daqui da Noite Estrelada dentro da imagem gerada, apesar de dizer que não pode gerar nada do Van Gogh.
Aqui vem um ponto 3 que eu acho importante: sempre cheque plágio ou cópia indevida. Se você vai fazer algo comercial e achou o resultado muito parecido, mande para o Reverse Image Search do Google. Por exemplo, você adorou aquela imagem, não sabia daquele quadro do Van Gogh chamado Noite Estrelada, coloca na pesquisa reversa do Google e veja se tem algo parecido. Aí você vai se blindar mais, especialmente para uso comercial.
Um quarto ponto nessa parte de direitos autorais e uso da IA é ser transparente quando o conteúdo foi gerado por IA. Isso já existe no TikTok e Instagram há um tempo. Se o conteúdo foi 100% gerado por IA e pode enganar alguém de alguma forma, eles pedem que se coloque “feito por IA” nesse conteúdo. Por exemplo, uma imagem do Lula e do Bolsonaro se abraçando e chorando juntos pode enganar alguém, então você tem que colocar que essa imagem foi feita por IA. A política normalmente das ferramentas é essa: se você está usando a IA de forma decorativa, que não importa para o contexto, está tudo bem, você não precisa indicar isso.
Aqui dentro do CR_IA a gente também faz isso: não indicamos que todos os nossos conteúdos foram feitos por IA, mas é importante ser transparente quando o conteúdo tem algo gerado por IA.
Quinto ponto: lembre-se que a IA deve agir como sua copilota, e não criar tudo por você. Isso vai influenciar muito no seu resultado. Você pode simplesmente pedir para a IA criar uma imagem ou um texto para você, e já ter o resultado direto, mas isso tem muito mais chance de você estar plagiando algo sem saber. Porém, se você vai fazendo interações no meio, fazendo um pouco, a IA fazendo um pouco, você fazendo um pouco, como a gente fala em nossa aula sobre IA como copilota aqui dentro do CR_IA, isso evita que aconteça esse tipo de erro, porque você está colocando seus próprios inputs, dando seus próprios feedbacks.
Assim, é praticamente impossível você estar fazendo algo plagiado. Especialmente se você adiciona experiência sua, opinião, análise própria — partes que humanizam o conteúdo que você está produzindo. Isso vai ajudar a se afastar de um eventual plágio. Existem mais motivos para isso ainda.
Sexto ponto: mantenha um registro do seu processo de criação com inteligência artificial, inclusive dos seus prompts. Guarde os prompts que você está usando, porque, se der algum problema, você pode dizer que talvez aquilo tenha sido parecido com algo. Outro dia fizemos um conteúdo com uma música que ficou muito parecida com a voz da Pabllo. Eu não pedi para ser parecida, mas quando ouvi pensei “pode dar problema”. Então vamos evitar problemas. Se der problema, você tem documentado seu processo e pode se defender.
Sétimo ponto: redobre o cuidado em usos comerciais e siga as políticas da sua empresa ou cliente. Acho que isso é importante. Qualquer coisa que vai para a rua a gente trabalha com muitas agências de publicidade — algumas delas optaram, e eu entendo por quê — que o que vai para a rua não use IA. A IA pode ser usada até a parte da criação, para ter ideias, mas o que vai para a rua não pode ser feito por IA.
Tudo bem, entendo esse tipo de política, que justamente tem esse cuidado para evitar problemas com o uso comercial. Atualmente, acho que este cuidado pode ser excessivo. Muitas coisas feitas com IA podem ir para a rua, mas vale a pena você sempre avaliar, fazer o reverse image search se achar que está plagiando algo. Ter cuidado é sempre importante. De novo, se você iterar, fazendo um pouco você e um pouco a IA, usando essa lógica de copiloto, vai ser muito difícil ter algum problema.
Lembre-se que cada cliente, e sua empresa também, precisam ter políticas de IA dentro dela para te resguardar. É importante levar isso para o cliente. Aqui dentro do CR_IA a gente faz isso também, com consultoria de políticas de ética nas empresas, para levar essa discussão adiante.
Enfim, uma coisa que eu gostaria que você levasse muito dessa aula e para a vida de uma forma geral é aprender mais sobre isso. Tem mais aulas sobre esse tema dentro do CR_IA, aproprie-se do tema e faça parte das discussões. Acho que há muita discussão rolando sobre ética e inteligência artificial de uma forma geral, mas quando falamos também de direitos autorais é importante saber um pouco disso e levar essa discussão adiante, para complementar o debate.
Enfim, é isso. Até a próxima aula.